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O aparecimento das relações feudais na Europa Ocidental

-Neste texto o autor descreve como surgiram as relações feudais na Europa Ocidental e quais as características dessas relações.

 

Os pequenos lavradores que procuravam a proteção e o amparo dos ricos e dos nobres acabaram por conseguir esta proteção e este amparo, pelo preço da perda da sua liberdade. Se não tinham terras, davam-lhes pequenas parcelas e às vezes alguns animais e cabanas para os ter. Mas eram obrigados a pagar por isso, quer trabalhando para os seus senhores (corveia) quer com parte da sua produção (renda). Em alguns casos, a assistência material prestada aos pequenos camponeses indefesos era tão grande que eles não só se obrigavam eles próprios ao serviço dos senhores, mas também vinculavam os seus descendentes a esse serviço. Como as condições de vida dos homens do povo livre, das antigas aldeias bárbaras, eram sensivelmente as mesmas, esta sujeição aos grandes proprietários e aos membros ricos da sociedade ia tornar-se uma prática universal.
Alguns camponeses que tinham as suas próprias propriedades e terras suficientes para fazer uma vida razoável também entraram voluntariamente ao serviço dos ricos e dos nobres para obterem a todo custo a sua proteção e o seu amparo. Desistiam dos seus direitos à terra e entregavam-na aos novos senhores, recebendo-a de novo com a obrigação de pagar renda como se nunca tivesse sido deles. Assim, a terra tornou-se uma terra arrendada e o seu antigo dono, um arrendatário.
Os ricos proprietários, como a Igreja Católica, e fundações, como mosteiros, asilos, etc., estavam sempre prontos a prestar assistência e amparo aos pequenos lavradores, que lhes entregavam as terras, para as receberem sob forma de terras arrendadas. Os mosteiros muitas vezes devolviam as terras arrendadas aos seus antigos proprietários, com mais uma parcela de terra – em geral parte de um bosque ou pântano – com a condição de a prepararem para ser semeada. Pouco a pouco, os habitantes das antigas comunas de aldeias, pequenos lavradores que trabalhavam a sua terra e até então tinham sido homens livres, tornaram-se camponeses dependentes ou servos, ligados à terra e ao serviço dos grandes proprietários. (...)
Os grandes proprietários adquiriram gradualmente novos direitos sobre a população camponesa local. Como as estradas eram más e as viagens longas e muito perigosas, era, muitas vezes, mais ou menos impossível um camponês recorrer ao rei para resolver com justiça um conflito de interesses entre eles e um poderoso senhor local. Assim, os ricos – e isto significava, sobretudo, os senhores feudais – foram-se tornando gradualmente detentores da justiça e mais tarde de todo o poder administrativo, dentro das suas grandes propriedades.
Para consolidar as suas conquistas, os senhores feudais procuravam obter do rei títulos que lhes dessem o direito que já tinham tomado para si. Estes documentos ficaram conhecidos pelo nome de carta de imunidade e o novo poder atribuído aos seus detentores chamava-se imunidade. A palavra immunis em latim significa isento, e estas cartas tornavam as terras dos grandes proprietários isentas de controle do rei e dos seus funcionários administrativos. Uma carta de imunidade dava aos proprietários poderes legais e administrativos sobre toda a sua propriedade e muitas vezes para além dela, pois os Estados bárbaros eram fracos e mal organizados.
A administração central e local, no verdadeiro sentido da palavra, não existia e aos reis convinha confiar as suas funções a senhores locais. O poder obrigava os senhores a irem às assembleias locais do povo, onde em geral se realizavam os processos legais, para presidir à manutenção da lei e da ordem em dada região. Por outras palavras, desempenhavam as funções administrativas e legais. Como recompensa por estes serviços, os senhores feudais recebiam o rendimento das terras que administravam; multas por ofensas legais, o direito de exigir toda a espécie de servidões a todo o povo que vivia sob a sua jurisdição – reparar estradas, construir pontes, barcos para a travessia de rios e mesmo castelos e fortalezas. Em troca da manutenção da lei e da ordem nos mercados, moinhos etc., o rei e os seus funcionários instituíram pedágios nos mercados, estradas, barcos e pontes, que eram cobrados pelos donos de terras que tinham cartas de imunidade.

(MANFRED, A.Z. Do feudalismo ao capitalismo. 2. Ed. São Paulo, Global)

 

#SAIBA MAIS:
- Detentor: aquele que conserva em seu poder; depositário.

Agricultura era usada como moeda de troca durante o feudalismo. (Wikimedia Commons)

Tancredo Professor . 2024
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