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A Primeira Guerra Mundial

ANTECEDENTES DA GUERRA
Após as guerras napoleônicas do início do século XIX, a Europa viveu um longo período de paz, perturbado apenas por conflitos localizados e de curta duração, como a Guerra Franco-Prussiana de 1870. No continente europeu, reinava a política do equilíbrio de poder, que visava evitar que algum país se fortalecesse a ponto de conseguir enfrentar não apenas um, mas uma coligação de países rivais.
Ao final do século, no entanto, a estabilidade econômica e a segurança proporcionada pela política de equilíbrio de poder entre as nações era mais aparente do que real. As disputas entre as potências imperialistas estavam cada vez mais acirradas, o que dificultava as soluções negociadas.
No plano social, aumentava o antagonismo entre as burguesias europeias, que podiam desfrutar de grande conforto material, e as massas operárias e camponesas economicamente oprimidas, que passavam a expressar seu descontentamento de forma organizada.

 


A BELLE ÉPOQUE
Na Europa, o período entre 1880 e 1914 ficou conhecido como Belle Époque (Bela Época). Esse período foi marcado pelo otimismo e prosperidade causados por um grande desenvolvimento tecnológico e pelo progresso industrial.
Esses avanços possibilitaram a criação de novos produtos, como o telefone e o automóvel, os quais causaram um grande impacto no cotidiano das pessoas que viviam nas cidades.
Apesar de parecer anunciar um período duradouro de progresso material, o otimismo desse período chegou ao fim com a eclosão da Grande Guerra, em 1914.

 

CLIMA DE GUERRA
“Os homens preferem a paz à liberdade”, proferiu o ministro francês Metternich durante o Congresso de Viena, ocorrido após a queda de Napoleão Bonaparte. Desde então, para evitar novos levantes liberais, montou-se, gradativamente, um sistema de equilíbrio de poder entre as nações: o concerto europeu. Graças a essas medidas, alguns historiadores denominam esse período como o “grande século XIX”, pois, de 1815 a 1914, a Europa não teve graves conflitos, com exceção da Guerra da Crimeia e da Guerra Franco-Prussiana.
No início do século XX; embora muitos se considerassem liberais; todos os países europeus eram monarquistas (as únicas exceções eram a França e a Suíça). As rivalidades provenientes de movimentos nacionalistas e da corrida imperialista nos continentes africanos e asiático criaram um clima de hostilidade entre diversas nações, que estavam ligadas umas às outras por sistemas de alianças diplomáticas.
Anos antes da Primeira Guerra Mundial, iniciada em 1914, livros e jornais europeus (principalmente alemães) defendiam a guerra como “o preço que se deve pagar pela cultura”, ou “um patamar para um nível mais elevado de criatividade e espírito”. Apesar dos movimentos antibélicos, muitos intelectuais e artistas acreditavam na guerra como a solução para problemas que iam além da economia e da política, como o escritor alemão Thomas Mann, para quem o conflito armado libertaria os seus contemporâneos de uma “realidade apodrecida”. A iminência de uma guerra era tamanha que, no dia 2 de agosto de 1914, o escritor checo de língua alemã Franz Kafka anotou em seu diário: “A Alemanha declarou guerra à Rússia – natação à tarde”. Kafka, longe de ser alienado, apenas foi mais um testemunho do que há muito era esperado por generais, políticos, intelectuais e pessoas comuns. Talvez não imaginassem a proporção que o conflito tomaria.

 

DISPUTAS IMPERIALISTAS
A disputa entre as potências imperialistas pelo domínio de territórios coloniais tornou-se mais intensa nas últimas décadas do século XIX. Os países europeus tinham a necessidade de garantir fontes de matérias-primas para suas indústrias. Além disso, o crescimento industrial acarretou crises de superprodução, o que tornava necessária a busca de novos mercados consumidores para os produtos dos países industrializados.
A Alemanha, por exemplo, após sua unificação em 1871, passou por um grande desenvolvimento industrial, aumentou sua produção de armamentos e investiu nas indústrias químicas, exercendo forte concorrência com os produtos ingleses no mercado europeu. O crescimento militar e econômico da Alemanha desagradava outras potências europeias. A própria Inglaterra foi ameaçada quando a Alemanha iniciou seu projeto de formar uma marinha mercante e de guerra capaz de desafiar a sua hegemonia. Além disso, duas nações não europeias, os EUA e o Japão, também avançavam no caminho imperialista em suas respectivas áreas de influência na América e na Ásia.
A tecnologia militar, acompanhando o processo de industrialização, teve grande desenvolvimento entre os anos 1880 e o início do novo século. As fronteiras nacionais tornaram-se áreas militarizadas e foram criados armamentos mais mortíferos, como fuzis de repetição, metralhadoras, lança-chamas, artilharia pesada, projéteis com gás venenoso e submarinos. Os navios ganharam blindagem de aço e motores-turbinas, tornando-se maiores e mais velozes, aumentando seu poder bélico. Desse modo, configurou-se a “paz armada”, em que as potências realizaram intensa corrida armamentista.

 

A PAZ ARMADA
Em 1890, Guilherme II subiu ao trono da Alemanha, demitindo o poderoso ministro Otto Von Bismarck, por não aceitar sua interferência nas decisões imperiais. Sob o comando do novo Kaiser (imperador), o país industrializou-se e militarizou-se ainda mais. O sistema de alianças defensivas de Bismarck, feitas para manter o país a salvo de ataques (Realpolitik) , deu lugar a uma política de expansão armada e a uma política expansionista e colonialista, destinada a achar para os alemães “um lugar ao Sol”, como exprimiu Bernhard von Bulow, ministro de Assuntos Exteriores da Alemanha, em 1897.
Era senso comum que uma ruptura da paz traria problemas de proporções inimagináveis à Europa. Entretanto, as tensões surgidas durante a expansão imperialista levaram ao que ficou denominado como período da “Paz Armada” (1875-1914), uma linear e ininterrupta corrida armamentista estimulada pelas inovações científicas e tecnológicas, que se somou à exaltação do nacionalismo e do patriotismo, prenunciando uma guerra.

 

O SENTIMENTO NACIONALISTA
O militarismo das potências imperialistas estava apoiado no crescente sentimento nacionalista. Esse sentimento manifestou-se de diversas maneiras a partir do final do século XIX.
Veja, a seguir, exemplos de manifestações nacionalistas no período que antecedeu a Primeira Guerra Mundial.
I. Na região dos Bálcãs, dominados pelo Império Turco-Otomano e pelo Império Austro-Húngaro, o sentimento nacionalista manifestou-se de maneira violenta. Minorias nacionais, como os macedônios, eslovenos, albaneses, croatas e ucranianos, lutavam por sua independência em relação aos turcos e aos austro-húngaros. Os sérvios; que já tinham se tornado independentes do domínio turco; aspiravam criar a Grande Sérvia, por meio da união dos povos eslavos que estavam sob o domínio turco e austro-húngaro. Essa política tinha apoio no pan-eslavismo, defendido e liderado pela Rússia, que se considerava a líder e guia natural dos povos eslavos do Sul (iugoslavos). Havia também o interesse russo em controlar as saídas para o mar, principalmente os estreitos de Bósforo e de Dardanelos.
Os russos, entretanto, encontraram resistência do Império Austro-Húngaro e da Alemanha, que projetava construir a estrada de ferro Berlim-Bagdá, para ter acesso às áreas petrolíferas do Golfo Pérsico. Cruzando os Bálcãs e seguindo em direção ao sul, pelo estreito de Bósforo, a ferrovia atravessaria territórios pertencentes ao Império Turco.
O ideal de unificação eslava, encabeçado pela Sérvia e que resultaria na Grande Sérvia, tornou-se mais distante quando as regiões da Bósnia e da Herzegovina foram tomadas ao domínio turco e anexadas à Áustria-Hungria, em 1908. Desse modo, para conquistar a unidade, os sérvios tinham agora de lutar contra os impérios Turco e Austro-Húngaro. Nos anos seguintes, essa situação provocou agitações nacionalistas na região, promovidas pela Sérvia com respaldo russo.
II. Na Alemanha, o nacionalismo girava em torno do pangermanismo, a ideia de unir os povos germânicos em um poderoso e extenso Império Alemão. Clubes patrióticos proliferavam, assim como organizações militaristas.
III. Na França, o nacionalismo era alimentado pelo sentimento de vingança, o “revanchismo francês”, marcado pelo desejo de retomar a Alsácia-Lorena, que compreendia províncias ricas em minério de ferro tomadas pelos alemães durante a Guerra Franco-Prussiana.

 

A POLÍTICA DE ALIANÇAS
No final do século XIX, o mundo se sujeitava à supremacia econômica de algumas potências capitalistas europeias, sobretudo a Inglaterra. Surgiram, entretanto, indícios do deslocamento desse centro dinâmico, pois alemães e norte-americanos sobrepunham-se aos ingleses na produção de ferro e aço, matérias-primas fundamentais para o desenvolvimento industrial do período.
Nos Estados Unidos, as indústrias químicas, elétrica e automobilística se desenvolviam consideravelmente e, na Alemanha, a indústria bélica prosperava com o programa naval de 1900, que visava conquistar um tardio império colonial, o que despertava e acirrava a rivalidade britânica. Além disso, as ambições coloniais alemãs no norte da África se chocavam com os interesses franceses, como ficou evidente na disputa dos dois países pelo controle do Marrocos na chamada Questão Marroquina de 1904.
A Inglaterra, por meio de suas casas bancárias, era responsável por mais da metade do total de capitais investidos em várias partes do mundo e constituía o maior império colonial e uma das maiores potências militares do início do século XX. Apesar disso, cada vez mais, sua hegemonia, a chamada Pax Britannica, era ameaçada por outros países imperialistas que exigiam a redivisão colonial, sobretudo na África e na Ásia.
A esses elementos desafiadores da paz mundial vieram se somar as reivindicações das minorias nacionais europeias, que exigiam direito de autogoverno, baseando-se nos ideias de unificação italianos e alemães e intensificando o militarismo europeu. Poloneses, irlandeses, finlandeses e, principalmente, os povos do antigo Império Austro-Húngaro (húngaros e grupos eslavos, como os sérvios, os croatas e os eslovenos) lutavam por suas independências, envolvendo as grandes potências e ativando suas rivalidades.
A derrota francesa na Guerra Franco-Prussiana acarretou a perda da região da Alsácia-Lorena para a Alemanha, o que despertou um forte espírito nacionalista, de revanche, entre os franceses, abrindo a possibilidade de uma nova guerra europeia. A Alemanha, desde sua unificação, fundamentou a política externa no isolamento da França, criando um sistema internacional de alianças político-militares que cerceassem o revanchismo francês.
Em 1873, o chanceler alemão Otto von Bismarck instaurou a Liga dos Três imperadores, da qual faziam parte a Alemanha, a Áustria-Hungria e a Rússia. Entretanto as divergências entre a Rússia e a Áustria com relação à região dos Bálcãs, originadas do apoio russo às minorias eslavas da região, que almejavam a independência, acabaram com essa aliança em 1878. Em 1882, o Reich (império) alemão firmou a Tríplice Aliança, unindo-se ao Império Austro-Húngaro e à Itália. Somente na última década do século XIX a França começou a sair de seu isolamento internacional, conseguindo estabelecer um pacto militar com a Rússia em 1894.
A Inglaterra se aproximou da França, formando com ela o bloco denominado Entente Cordiale, em 1904, que fundia os interesses comuns dos dois países no plano internacional.
A partir de então, as antigas hostilidades franco-inglesas foram esquecidas para que os dois países enfrentassem um inimigo comum: o sucesso econômico da Alemanha, sua expansão colonial e seu exaltado nacionalismo.
A adesão da Rússia à Entente Cordiale originou a Tríplice Entente. Assim, passavam a existir na Europa dois grandes blocos antagônicos: a Tríplice Aliança e a Tríplice Entente, que fomentaram a tensão que levou os países europeus aos preparativos armamentistas.
O posicionamento da Itália diante desses dois blocos era dúbio, pois, embora fizesse parte da Tríplice Aliança, cultivava sérios conflitos com o Império Austro-Húngaro. Por causa da disputa pelas regiões irredentas – Trentino, na parte sul do Tirol e da Ístria -, chegou a assinar acordos secretos de não agressão com a Rússia e com a França, países da Tríplice Entente.

 

O INÍCIO DO CONFLITO
É importante considerar que a região balcânica se encontra no meio de interesses divergentes. De um lado, o interesse comum dos europeus de enfraquecer os turcos, que até o início do século XX dominavam a península. Um segundo interessado, o Império Russo, além de apoiar os eslavos que lá residiam, desejava dominar os estreitos que lhe garantiriam o acesso ao Mediterrâneo. E o Império Austro-Húngaro não via com bons olhos a possibilidade de surgirem novos Estados que viessem a lhe trazer dificuldades.
Em 1908, ocorreu a primeira crise, quando os austríacos anexaram as regiões da Bósnia e da Herzegovina, provocando a ira dos sérvios. Em 1912, ocorreu a segunda crise, quando se formou a “liga balcânica”, que entrou em guerra contra o Império Turco, vencendo-o e tornando possível a independência da Albânia, Sérvia, Bulgária, Grécia e Montenegro.
Ora, a independência da Albânia e a anexação da Bósnia-Herzegovina pelos austríacos impediam que a Sérvia realizasse seu projeto de expansão. Isso causou descontentamentos e levou os setores mais radicais dos nacionalistas sérvios a criarem uma organização terrorista, a Mão Negra, que tinha ramificações na Bósnia. E foi justamente um estudante da Bósnia, de nome Gavrilo Princip, quem recebeu a incumbência de executar o plano do assassinato do arquiduque austríaco Francisco Ferdinando.
No dia 28 de junho de 1914, o arquiduque austríaco Francisco Ferdinando, herdeiro da coroa do Império Austro-Húngaro, visitava a cidade de Sarajevo, na Bósnia. O objetivo da visita era demonstrar aos rebeldes bósnios quem dava as ordens na região. Mas o resultado foi outro.
Verifica-se, ao examinar essa síntese das principais questões que afetavam a diplomacia europeia do início do século XX, que a situação chegara a tal ponto que não seria difícil transformar um acontecimento de menor importância em catalisador das insatisfações e, a partir daí, dar-se início a um conflito.
Foi o que aconteceu em 28 de junho de 1914.
Nesse dia, na cidade de Sarajevo, capital da Bósnia, o arquiduque Francisco Ferdinando e sua esposa foram assassinados por um estudante bósnio Gavrilo Princip, de 24 anos. Preso em seguida ele foi barbaramente torturado e incriminou a organização Mão Negra, da Sérvia, o que serviu de base para o ultimatum enviado pelo governo austríaco ao governo Sérvio, exigindo uma série de providências, algumas das quais absurdas. Mas a questão não teve como se resumir ao Império Austro-húngaro e à Sérvia, visto que a Sérvia era habitada por eslavos. Assim, o Império Russo entendeu que, em nome do pan-eslavismo, cabia-lhe dar toda a proteção aos sérvios.
Num primeiro momento, o governo sérvio optou por atender a algumas das exigências austríacas, recusando apenas a que feria a soberania sérvia. Mas o imperador austríaco não aceitou tal recusa. Tendo a promessa de apoio dos russos, o governo sérvio decidiu, então, recusar todas as exigências, recebendo, assim, a declaração de guerra de guerra, em 28 de julho de 1914. Era o início do conflito que, por meio de alianças e pactos, envolveu diversos Estados.

 

O DESENVOLVIMENTO DO CONFLITO
A Grande Guerra ou Primeira Guerra Mundial foi assim chamada por envolver todas as grandes potências do mundo ocidental da época. No esforço de guerra, cada Estado assumiu o controle da economia e todos os cidadãos foram recrutados para participar tanto do exército quanto da produção industrial, principalmente de armamentos. Os tanques de guerra, os encouraçados, os submarinos, os obuses de grosso calibre e a aviação, entre outras inovações tecnológicas da época, constituíram artefatos bélicos de um poder de destruição até então inimaginável.
De forma sintética, pode-se dizer que o conflito teve duas fases: em 1914, houve a guerra de movimento e, de 1915 em diante, a guerra de posição ou de trincheiras. A primeira fase estava relacionada ao Plano Schlieffen, estratégia ofensiva alemã elaborada ainda em 1905, sob os efeitos do clima de revanchismo francês que preponderava em sua política externa. Esse plano previa a mobilização de boa parte do exército alemão para invadir o território francês, pela Bélgica e pela Alsácia-Lorena, e render Paris ao final de seis semanas. Alcançado tal intento, os alemães julgavam que estariam livres para enfrentar os russos, direcionando suas tropas para o ataque e a invasão daquele país.
Para atacar a França, os alemães invadiram a Bélgica, violando a neutralidade desse país. Esse foi o pretexto para a Inglaterra declarar guerra à Alemanha. Mesmo assim, a marcha dos exércitos alemães em direção a Paris surpreendeu as tropas francesas. Do lado leste, uma ofensiva russa inesperada, ainda em 1914, obrigou as forças alemãs a se dividirem, deslocando tropas para a região da ex-Prússia Oriental. A França, beneficiando-se do apoio inglês, conteve o fulminante ataque alemão na Batalha do Marne, em setembro de mesmo ano. Com o fracasso da guerra de movimento, teve início a guerra de posição ou de trincheiras, que, devido às condições dos combatentes, originou a usual denominação de “guerra de sangue e barro” para o período. Outras potências entraram no conflito, posicionando-se ao lado da Tríplice Entente (França, Inglaterra e Rússia), Japão (1914), Itália (1915), Romênia (1916) e Grécia (1917). Ao lado das chamadas potências centrais (Alemanha e Áustria-Hungria) colocaram-se o Império Turco-Otomano (1914) e a Bulgária (1915).
Enquanto na frente ocidental a guerra entrava na fase das trincheiras, na frente oriental ocorria uma sequência de vitórias alemãs, como na Batalha de Tannenberg, na qual 100 mil russos foram aprisionados. Em 1916, em Verdun, frustrou-se nova ofensiva alemã contra a França, mantendo-se em geral as posições já existentes. O ano de 1917, ao contrário, foi marcado por acontecimentos decisivos para a guerra.
As contínuas derrotas russas aceleraram a queda da autocracia czarista, culminando nas revoluções de 1917, que resultaram na implantação do regime socialista. Com a ascensão do novo governo, concluiu-se um acordo de paz em separado, o Tratado de Brest-Litovski, de 1918, oficializando a saída dos russos da guerra.
Também em 1917, a derrota italiana na Batalha de Caporetto possibilitou às potências centrais voltarem-se para a frente ocidental franco-inglesa, e a Alemanha intensificou o bloqueio marítimo à Inglaterra, objetivando deter seus movimentos e o abastecimento da ilha da Grã-Bretanha.
Sentindo-se ameaçados pela agressividade marítima alemã, os Estados Unidos, que até então se mantinham neutros, embora fornecessem alimentos e armas aos países da Entente, usaram como pretexto o afundamento do transatlântico Lusitânia (que resultou na morte de dezenas de passageiros norte-americanos) para declarar guerra contra as potências centrais.
Os Estados Unidos eram os maiores fornecedores de suprimentos para a Europa e temiam à ameaça de paralização de suas exportações diante da guerra submarina alemã e à intenção germânica de se aliar ao México em troca de ajuda militar na reconquista dos territórios mexicanos perdidos para os norte-americanos.
A entrada dos Estados Unidos na guerra, em 1917, com seu imenso potencial industrial e humano, reforçou o bloco liderado pela Inglaterra e pela França, que passou a obter sucessivas vitórias perante os alemães a partir do final de 1918.
A derrota das potências centrais diante da superioridade econômico-militar dos aliados; como eram denominados os integrantes da Entente; acarretou a renúncia do Kaiser alemão; em novembro de 1918, e a assinatura do armistício. O cessar-fogo foi conseguido por meio de um plano de paz formulado pelo presidente norte-americano Woodrow Wilson (os chamados 14 Pontos de Wilson), que pregava “uma paz sem vencedores”.

 

AS CARACTERÍSTICAS DA GUERRA
Para a época em que ocorreu, a Grande Guerra teve uma duração incomum. No final do século XIX, as guerras entre países costumavam ser mais rápidas; as mais demoradas eram conflitos coloniais, ocorridos longe da Europa. No início, todos os contendores esperavam uma guerra de movimento (em que tropas se deslocam e conquistam outro território), rápida, mas nenhuma potência conseguiu vantagem suficiente para sobrepor-se a outra e vencer o conflito. Por isso, ele derivou para uma guerra de posição (em que o objetivo é não perder terreno e, aos poucos, ir conquistando território do inimigo), o que tornou as trincheiras a marca registrada da Primeira Guerra Mundial.
Além disso, o equilíbrio de forças levou os oponentes a tentar convencer os países neutros a se engajar em um lado ou em outro. Para isso, foram feitas promessas de territórios e benefícios que não puderam ser cumpridas ao final da guerra, provocando novos descontentamentos.
Em termos de extensão do conflito, a amplitude também foi uma marca importante do confronto, resultado do sistema de “paz armada”, que juntava o armamentismo com alianças que iam se estendendo pelos continentes com base em interesses comuns entre países. Pela primeira vez, todos os grandes países da Europa entraram em guerra ao mesmo tempo.
A África foi envolvida no conflito na medida em que a maior parte do seu território, naquele momento, era de colônias europeias. Na Ásia, o governo japonês viu mais vantagens em envolver-se no conflito do que se manter neutro, e declarou guerra à Alemanha interessado nas bases alemãs na China. Os chineses, por sua vez, entraram na guerra, pelo menos nominalmente, para não se inferiorizarem diante do Japão. O Oriente Médio foi arrastado para a guerra junto com a Áustria e a Alemanha.
Em termos de intensidade, a Primeira Guerra Mundial pode ser vista como a primeira experiência de “guerra total”, ou seja, que exige que todos os habitantes de um país e todas as suas forças se voltem para sustentar as tropas com recursos materiais e humanos. Isso se deveu ao impasse criado pela guerra de posições. O Estado passou a dirigir toda a economia para o esforço nacional de vencer os inimigos, e por isso uma das estratégias da guerra é atingir a economia e a produção dos outros. A guerra também avançou para o setor psicológico: esse era o objetivo de bombardear a população civil nas cidades distantes dos fronts, ou seja, abater o moral dos adversários. Essa prática seria tristemente comum nas guerras do século XX.

 

OS TRATADOS DE PAZ: SEMENTES PARA A GUERRA
Com o fim das operações militares, os vitoriosos reuniram-se em 1919 no Palácio de Versalhes, nos arredores de Paris, para as decisões do pós-guerra. O encontro teve a participação de 32 países, incluindo o Brasil, e foi dirigido pelo presidente norte-americano Wilson e os chanceleres Lloyd George, da Inglaterra, e Georges Clemenceau, da França.
O plano proposto pelo presidente norte-americano foi inviabilizado por diversos acordos paralelos e, principalmente, por pressão da França e da Inglaterra. As conversações resultaram no Tratado de Versalhes, que considerou a Alemanha culpada pela guerra e criou uma série de determinações que visavam a enfraquecê-la e desmilitarizá-la.
Por esse tratado, estabelecia-se a devolução da Alsácia-Lorena à França e o acesso da Polônia ao mar por uma faixa de terra dentro da Alemanha que desembocava no porto livre de Dantzig – seria o chamado “corredor polonês”. A Alemanha perdia todas as suas colônias ultramarinas e parte de seu território europeu para os franceses, ingleses e seus aliados. Perdia também a artilharia e a aviação; passava a ter um exército limitado a 100 mil homens e ficava proibida de construir navios de guerra. Era ainda obrigada a indenizar as potências aliadas pelos danos causados, num total aproximado de 30 bilhões de dólares, valor que foi sendo renegociado na década de 1920 até ser extinto em 1932.
O Tratado de Versalhes também oficializou a criação da Liga das Nações, que funcionaria como um fórum internacional no interesse da paz mundial. Essa pretensão, porém, não se concretizou, pois a liga não contou no início com a participação da Alemanha e da Rússia nem do próprio país que a idealizara e que se transformara na maior potência mundial: os Estados Unidos. Por discordar de muitas decisões de Versalhes, os norte-americanos preferiram assinar com a Alemanha um acordo de paz em separado.
No mesmo ano de 1919, o Império Austro-Húngaro foi desmembrado pelo Tratado de Saint Germain. A Áustria perdeu a saída para o mar e foi obrigada a reconhecer a independência da Polônia, da Tchecoslováquia e da Hungria e a criação do Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos (que, em 1929, adotaria o nome de Iugoslávia), perdendo, assim, a maior parte de seu território.
Desse modo, o conjunto de tratados assinados entre 1919 e 1921 selou a desintegração territorial dos impérios Austro-Húngaro, Turco-Otomano (Tratado de Sèvres, depois reformado pelo Tratado de Lausanne) e Alemão. Ao mesmo tempo, determinou o início do processo de consolidação da independência de novos Estados, cuja soberania foi ratificada pelas populações envolvidas por meio de plebiscito. Tais países, quase todos situados na Península Balcânica e constituídos de etnias eslavas, passaram a integrar as novas áreas para a atuação dos interesses capitalistas das potências vencedoras. Com a Hungria foi assinado o Tratado de Trianon e com a Bulgária, o Tratado de Neuilly.
Somado ao fato de que essas mesmas potências conseguiram, ao final das discussões diplomáticas ocorridas no período, manter praticamente intactas suas possessões na África e na Ásia, verificou-se, na década de 1920, o fortalecimento da supremacia econômica e financeira dos Estados Unidos, da Inglaterra e da França. Vinte anos mais tarde, essa supremacia seria contestada pelo espírito revanchista alemão que não havia morrido em Versalhes nem nos acordos posteriores.
Grandes impérios autoritários foram destruídos: o Império Otomano, o domínio monárquico dos Habsburgos, que comandava boa parte da Europa Central, a Alemanha monárquica dos Kaisers e a Rússia dos czares. A origem desses regimes dinásticos era muito anterior à Revolução Francesa, e seu desaparecimento levou junto seus vestígios do Antigo Regime.

 

O BRASIL NA GUERRA
Tão logo começou a Primeira Guerra Mundial, o governo brasileiro decretou a neutralidade e assim permaneceu ao longo dos três primeiros anos do conflito. A situação começou a se modificar em abril de 1917, quando o país rompeu relações diplomáticas com a Alemanha pelo fato de um submarino alemão ter afundado um navio comercial brasileiro no litoral norte da França. No mês seguinte, dois outros navios mercantes brasileiros foram bombardeados na Europa. Como represália, o governo do Brasil decretou o fim da neutralidade e apreendeu 45 embarcações alemãs ancoradas no litoral brasileiro. O ataque a um quarto navio mercante, em outubro de 1917, levou o Brasil a decretar guerra à Alemanha, tornando-se assim o único país da América do Sul a entrar no confronto mundial.
As tropas brasileiras eram, em sua maioria, mal preparadas; o Exército e a Marinha contavam com pouca quantidade de armas e embarcações e as que existiam eram, de modo geral, obsoletas. Por essas características, segundo alguns analistas, a participação do Brasil no conflito foi muito mais “simbólica” do que de efetiva participação militar.
O governo brasileiro enviou em maio de 1918 seis navios de combate e mais dois navios auxiliares que ficaram navegando ao longo da costa da África para observar a movimentação das forças inimigas. O Brasil também enviou uma missão de 92 médicos à França com o objetivo de instalar um hospital militar em Paris. Porém, mais do que atender feridos de guerra, os médicos acabaram cuidando principalmente das vítimas da gripe espanhola, que se espalhava rapidamente.
Essa doença, que se alastrou pelo mundo entre 1918 e 1919, era capaz de matar uma pessoa em até 72 horas depois de sua contaminação. Por ter aparecido ainda no período de guerra, sua propagação foi facilitada pelos deslocamentos das tropas militares pelos campos de batalha. Segundo algumas estatísticas, a gripe espanhola matou 22 milhões de pessoas em todo o mundo, número superior ao dos mortos nos combates da Primeira Guerra Mundial.

 

A PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES NA GUERRA
As mulheres que viviam nos países que participaram da guerra também sofreram as consequências do conflito. Com o deslocamento de grande número de homens para os campos de batalhas, muitas mulheres de classe média e alta tiveram que trabalhar fora de casa, assim como já faziam as mulheres pobres.
No campo, as mulheres ficaram responsáveis principalmente pela produção agrícola e pela criação de animais. Muitas das que viviam nas cidades, por sua vez, foram trabalhar no setor dos transportes, dirigindo ônibus e caminhões, e também nas indústrias em geral, entre elas, a bélica. Também houve muitos casos de mulheres que foram para os campos de batalha trabalhar como enfermeiras, cozinheiras, motoristas de ambulância e escriturárias.
Durante o período da guerra, as mulheres tiveram a oportunidade de vivenciar experiências novas que lhes proporcionavam um maior sentimento de liberdade. Apesar das dificuldades e dos sofrimentos, a guerra lhes propiciou muitas conquistas que contribuíram para a emancipação feminina. Com o final dos conflitos e o retorno dos soldados para casa, muitas delas deixaram de trabalhar nos serviços considerados masculinos, porém, conseguiram manter e ampliar muitas de suas conquistas. Em vários países, por exemplo, elas puderam se afirmar como profissionais e adquirir independência financeira.
Muitas mulheres conseguiram garantir melhores condições de trabalho e conquistaram o direito de estudar em universidades. Além disso, logo depois da guerra, o voto feminino foi legalizado em vários países.
Houve também uma expressiva mudança no comportamento feminino. As mulheres alcançaram liberdade para sair sozinhas e dirigir automóveis, passaram a usar roupas mais confortáveis e aderiram ao uso dos cosméticos.

 

A PROPAGANDA A FAVOR DA GUERRA
Milhões de jovens europeus foram recrutados para a guerra, deixando para trás a universidade, a família, o trabalho, o noivado e os sonhos de todo jovem. Muitos dos que foram à guerra acabaram mortos ou mutilados nos combates. Entre os que seguiam lutando, muitos enviaram notícias terríveis dos campos de batalha, desencorajando outros a irem lutar. Diante de um custo tão alto, os governos dos países em guerra procuravam justificar o conflito e assim conquistar o apoio da população.
A propaganda nacionalista, feita por meio de fotografias e cartazes, foi o principal instrumento da campanha oficial a favor da guerra. Ela também servia para convocar voluntários para as equipes médicas e para levantar recursos às campanhas militares. A propaganda geralmente apelava para a emoção e relembrava acontecimentos da história do país que alimentavam o fervor patriótico.
O caso da Grã-Bretanha era muito significativo. Em 1914, mesmo sendo o maior império transoceânico do mundo, o país tinha apenas um exército profissional e não praticava uma política de serviço militar como a França e a Alemanha. Na Grã-Bretanha, assim como nos outros países, os cartazes de convocação foram usados durante todo o conflito. A ameaça de uma invasão alemã à ilha foi utilizada como tema de vários cartazes.
Os Estados Unidos foram os maiores produtores de cartazes da Primeira Guerra Mundial. O governo norte-americano investiu na criação do Comitê de Informação Pública, órgão encarregado de preparar campanhas publicitárias com o objetivo de promover a guerra junto à opinião pública.

Tancredo Professor . 2024
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