Em meados do século XVI, desencadeou-se na Europa um movimento de caráter religioso, político e econômico que contestava a estrutura e os dogmas da Igreja Católica: a Reforma Protestante. Ocorrida paralelamente ao Renascimento e à formação das monarquias nacionais europeias, ela expressou a necessidade de adequação da religião às transformações decorrentes do desenvolvimento do capitalismo.
ANTECEDENTES
No fim da Idade Média, a Europa convivia com o constante medo dos castigos reservados aos pecadores no inferno. Quem estimulava essa tensão era a própria Igreja, que enriquecia com a venda de indulgências (perdão dos pecados). A prática financiava o luxo do alto clero, mas provocava profundo descontentamento dentro da instituição.
A incipiente burguesia também estava insatisfeita. Ao proibir a usura - empréstimo de dinheiro a juros - e o lucro excessivo (decorrente da venda por um preço superior ao "preço justo"), a doutrina católica freava o desenvolvimento das atividades bancárias e comerciais, prejudicando a alma do negócio burguês.
Ao mesmo tempo, formavam-se as monarquias nacionais. Com o estabelecimento de fronteiras, a Igreja, grande proprietária de terras, passou a ser considerada potência estrangeira, o que estimulou conflitos entre reis e o papa.
Nesse contexto, começaram a surgir importantes críticos da Igreja Católica. Destacaram-se John Wycliffe, no século XIV, na Inglaterra, e Jan Huss, no século XV, na Boêmia - região do Sacro Império Romano-Germânico. Eles condenavam a venda de indulgências, a opulência do clero e defendiam o confisco dos bens da Igreja. Os dois foram precursores de um movimento revolucionário que começaria, de fato, no século XVI.
A REFORMA DE LUTERO
Em 1517, indignado com a venda de indulgências, o monge alemão Martinho Lutero afixou na porta da igreja em que pregava 95 teses, nas quais condenava várias práticas da Igreja. Após negar as exigências de retratação do papa, Lutero foi excomungado, tendo queimado publicamente a bula - documento papal que o condenou.
Exilado na Saxônia, o monge desenvolveu sua nova doutrina, que tinha como base os princípios de predestinação, de Santo Agostinho. Segundo Lutero, a única saída para a salvação é a fé, não havendo necessidade de intermediários entre o homem e Deus - papel dos sacerdotes no catolicismo. Além da extinção do clero regular, ele defendia a livre leitura e interpretação da Bíblia pelos fiéis e a submissão da Igreja ao Estado.
A nobreza germânica apoiou Lutero, pois suas ideias ofereciam uma justificativa para que eles se vissem livres da interferência política da Igreja nos principados germânicos do Sacro Império. No entanto, o Vaticano pressionou, e, em 1521, o imperador Carlos V convocou uma assembleia, a Dieta de Worms, que condenou Lutero por heresia. Porém, o monge continuou atraindo a simpatia dos nobres. Oito anos mais tarde, na Dieta de Spira, propôs-se tolerar o luteranismo onde já tivesse sido instalado, mas impedir sua propagação. Alguns principados protestaram, o que deu origem ao nome protestantismo. Em 1555, após anos de luta, foi firmada a Paz de Augsburgo, que consolidou a vitória do luteranismo. Foi estabelecida a liberdade religiosa para os príncipes - cuja fé deveria ser adotada pelos súditos -, e estes passaram a se apropriar dos bens da Igreja. Além da Alemanha, o luteranismo se difundiu por Suécia, Noruega e Dinamarca.
As pregações de Lutero estimularam movimentos que pretendiam causar transformações ainda maiores na sociedade. Um dos mais importantes ocorreu em 1524: a revolta camponesa dos anabatistas - nome pelo qual eram conhecidos os membros do grupo liderado pelo ex-discípulo de Martinho Lutero, Thomas Münzer, que defendia de forma violenta o fim da propriedade privada e a distribuição igualitária das riquezas. Lutero ficou do lado dos nobres, incitando a repressão, que acabou com a execução de Münzer no ano seguinte.
A REFORMA DE CALVINO
A primeira tentativa de reforma na Suíça se deu com Ulrich Zwinglio, estudioso de Lutero, que propôs uma doutrina mais radical. A briga entre protestantes e católicos desencadeou uma guerra civil entre 1529 e 1531, ano em que Zwinglio morreu. A Paz de Kappel determinou a autonomia religiosa para cada região do país.
Alguns anos depois, chegou a Genebra o religioso francês João Calvino, que reconhecia os princípios da predestinação - segundo a qual apenas alguns homens estão destinados à salvação - e da justificação pela fé. No entanto, pregava que as atividades comerciais e financeiras eram vistas com bons olhos por Deus e, portanto, em vez de condená-las, as encorajava.
Ao justificar a moral da ascendente burguesia, o calvinismo difundiu-se mais que o luteranismo. Na Escócia - para onde foi levado, por John Knox -, seus seguidores foram chamados de presbiterianos; na França, de huguenotes; e na Inglaterra, de puritanos.
A REFORMA INGLESA
Na Inglaterra, a reforma foi desencadeada pelo rei Henrique VIII. Querendo tomar para si o poder que a Igreja Católica tinha em seu país, ele viu em sua mulher um bom pretexto para criar tensões com a Santa Sé. Argumentando que, após 18 anos de casamento, Catarina de Aragão não lhe havia dado nenhum herdeiro homem, pediu a Roma a anulação de matrimônio. A requisição foi negada, e Henrique VIII rompeu com o papa.
Em 1533, o Parlamento britânico aprovou o divórcio, e o rei se casou com uma dama da corte, Ana Bolena. No ano seguinte, Henrique VIII fundou a Igreja Anglicana, da qual era líder supremo. Após ser excomungado pelo papa, confiscou as terras católicas e extinguiu mosteiros. As propostas da nova religião em muito se assemelhavam às do catolicismo, o que resultou em sérios conflitos com os puritanos no século XVII.
CONTRARREFORMA
A reação católica à expansão das doutrinas protestantes ficou conhecida como Contrarreforma. O papa Paulo III convocou, em 1545, o Concílio de Trento, que condenou o protestantismo e reafirmou os princípios católicos. A Inquisição foi reativada, e se instituiu o Index Librorum Prohibitorum - uma lista de livros proibidos aos católicos. Mas algumas reformas internas foram empreendidas: decidiu-se regular as obrigações do clero e o excesso de luxo na vida dos religiosos.
A Contrarreforma não conseguiu acabar com protestantismo, apenas freou sua expansão. Um de seus maiores êxitos foi a disseminação da fé católica pelas colônias europeias - inclusive o Brasil-, trabalho realizado pela Companhia de Jesus, a ordem dos jesuítas, criada em 1534. É graças a ela que a América Latina comporta o maior número de católicos no mundo.